PF aponta
superfaturamento na obra da ferrovia Norte-Sul
Vinte
e cinco anos atrás, uma concorrência de cartas marcadas tornou a ferrovia
Norte-Sul um ícone da malversação de negócios públicos no governo José Sarney.
O
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva reabilitou a obra, mas uma investigação
da Polícia Federal mostra que pouco mudou desde então.
Justiça manda sequestrar bens da família do ex-presidente da Valec
Laudos
periciais obtidos pela Folha apontam indícios de que houve conluio entre
as construtoras encarregadas da obra, cobrança de propina e um sobrepreço de
mais de R$ 100 milhões no trecho da ferrovia que cruza Goiás.
Os
documentos ajudam a entender o que levou o ex-presidente da estatal responsável
pela ferrovia, a Valec, a ser preso no dia 5 de julho.
Acusado
de enriquecimento ilícito, José Francisco das Neves, o Juquinha, foi solto na
última semana, após a Justiça avaliar que ele não oferece risco para a
investigação.
Na
noite de anteontem, a 11ª Vara Federal de Goiânia decidiu sequestrar bens da
família dele --inclusive os comprados antes de supostos desvios na Norte-Sul e
adquiridos de forma legal.
O
dinheiro pode ser usado para ressarcir os cofres públicos --para o Ministério
Público Federal, seria a primeira decisão com base na nova lei sobre lavagem de
dinheiro.
Os
peritos da PF analisaram o trecho da Norte-Sul entre Palmas (TO) e Anápolis
(GO), contratado por R$ 622 milhões. Comparando os preços das construtoras e os
do mercado, acharam diferença superior a R$ 100 milhões.
Alan
Marques - 18.out.07/Folhapress
|
||
José
Francisco das Neves, o Juquinha, ex-diretor da Valec
|
No
lote 2, um trecho de 52 km entre Ouro Verde de Goiás e Pátio de Jaraguá, a
polícia encontrou sobrepreço de R$ 25,5 milhões --20%.
A
concorrência foi vencida pela Camargo Corrêa, mas a empreiteira deixou a obra.
Ela foi entregue à Constran em 2009, mas o contrato venceu e a obra está
parada.
No
lote 3, com 71 km entre Pátio de Jaraguá e Pátio de Santa Isabel, a PF apontou
sobrepreço de R$ 22 milhões, ou 13,5%. A obra foi concluída pela Andrade
Gutierrez.
Nos
105 km entre Pátio de Santa Isabel e Pátio de Uruaçu, o lote 4, o sobrepreço
apontado foi de R$ 48,5 milhões --ou 25% a mais. A Constran também abandonou o
lote, entregue em 2009 à SPA Engenharia. O contrato venceu, e a obra parou.
Lançada
em 1986, a Norte-Sul foi interrompida depois que a Folha apontou fraude na
concorrência da obra. Uma nova licitação foi feita em 2004, no governo Lula.
Orçada
em R$ 6 bilhões e dividida em vários contratos, a obra só prossegue porque as
empresas aceitaram construir sem receber todo o valor contratado (parte é
retida enquanto se discute o preço).
A
PF reuniu indícios de que parte do dinheiro foi desviada para pagar propina.
A
polícia considera revelador um diálogo telefônico gravado em outubro de 2011,
entre o advogado de Juquinha e um ex-diretor da Valec, Luiz Carlos Machado de
Oliveira.
O
advogado pergunta a Oliveira se ele conversou "com a Galvão sobre aquele
assunto", ouvindo como resposta: "Conversei. Eles dizem que vão
acertar na semana que vem, assim que receberem".
Dez
dias depois, a Queiroz Galvão recebeu R$ 4 milhões da Valec por conta de um
túnel na Norte-Sul. Para a polícia, há suspeita de propina.
A
investigação aponta sobrepreço de R$ 5 milhões no lote da Queiroz Galvão (de
Anápolis a Campo Limpo).
Para
a PF, um dos motivos para o superfaturamento foi o conluio entre as empresas.
Laudo observa que 17 empreiteiras se interessaram, mas só 7 ficaram na disputa,
exatamente o número de lotes.
Nenhum comentário:
Postar um comentário